quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

O Unicórnio

Mais um admirável texto da minha amiga Bárbara, despertou em mim uma necessidade incontrolável de prestar alguns esclarecimentos em relação a algumas das séries médicas que habitam os nossos canais televisivos. Aparentemente a televisão descobriu que o comum dos mortais, que abomina hospitais e tudo o que tenha a haver com eles, entretém-se a ver séries passadas em hospitais. Vá-se lá compreender o comum dos mortais e os seus devaneios...a psicologia humana é uma teia muito densa.

Dr House
Resumo: Um médico internista cinquentão, coxo e toxicodependente, tem um affair com uma administradora hospitalar (razão pela qual mantém o seu emprego) e é confrontado com casos que não lembram nem ao diabo. Está assessorado por um conjunto de marrões, também eles internistas, que além de acharem que a Granulomatose de Wegner, o Lupus Eritmatoso Disseminado a Porfiria ou a Sarcoidose são sempre diagnósticos prováveis, conseguem inverter todo o fluxograma diagnóstico partindo dos exames mais complexos para os menos complexos saltando outros fundamentais. Esta esquizofrenia diagnóstica, agrava-se quando se percebe que são eles próprios que realizam estes exames, tipo biópsias cerebrais, ressonâncias magnéticas e cateterismos cardíacos. Na dúvida, os doentes levam com provas terapêuticas de tuberculostáticos, anti-retrovirais ou até quimioterapia !
Credibilidade da série de 0 a 10: -1 Como é óbvio os internistas não dormem com administradoras hospitalares.

Anatomia de Grey
Resumo: A anatomia de Grey, prima pelos esteriótipos. Por entre os especialistas, há um gajo giro e inteligente que obviamente é Neurocirurgião. Há um gajo giro e "bon vivant" que obviamente é Cirurgião Plástico, a lésbica grande é Ortopedista, a Ginecologista gira pirou-se para outra série e vejam lá quem é que representa a Cirurgia Geral... a Miranda Bailey... já o anestesista, que obviamente dorme com a Cirurgiã, nem me lembro do nome...O resto é internagem residente que faz o melhor que pode, apesar de não enganar ninguém. A miúda marrona, feia e com mau feitio quer ser Cirurgiã Cardíaca, a miúda gira descompensada quer ir para Cirurgia Geral,... mas se calhar quer é Neurocirurgia, o gajo charmoso, com algum estilo vai fazer as delicias das mães das criancinhas na pediatria e a irmã mais nova da que quer ser Cirurgiã, só sabe que quer dormir com o Plástico, ou será com o futuro Pediatra.... Nesta série, eles dormem com elas, elas dormem com elas, e todos dormem mais ou menos com todos de acordo com a temporada em questão. 
Credibilidade da série de 0 a 10: 1 Como é óbvio, é tudo uma questão de sexo e não de diagnósticos ou terapêuticas.

E.R.
Resumo: Para quem gosta de um mínimo de realismo em relação ao trabalho no Serviço de Urgência.
Bons casos, bons fluxogramas diagnósticos e boas opções terapêuticas.
Credibilidade da série de 0 a 10: 8 Pela quase ausência de sexo.

Ponto comum. Na maioria das séries televisivas passadas em hospitais, há uma sala de médicos, com alcatifa e caminhas e candeeiros de cabeceira e camas e lençóis onde acontece de tudo um pouco incluindo sexo. Isto porque os internos americanos chamam-se "residents" ou seja, passam tanto tempo no hospital que praticamente residem por lá. Em portugal os médicos são "homeless", trabalham nos hospitais, mas ninguém os quer por lá. Portanto, sexo na sala dos médicos seria como sexo num parque de estacionamento de um aeroporto... exigiria uma química quase transcendental entre os dois...e uma física, tipo nuclear, explosiva... Já para não falar da abstracção necessária ao movimento de passageiros e aos diversos anúncios das partidas e chegadas... Isto pertence portanto ao reino da fantasia. Em Portugal, a cena mais escabrosa que se poderá encontrar numa sala de médicos são 7 ou 8 pessoas assexuadas, semi-deitadas ou semi.sentadas, em cadeirões desconfortáveis, alinhados contra a parede, a partilhar odores corporais e a roncar descompassadamente ás quatro da manhã. É isto, e pouco mais.

A comunidade swinger anglo-saxónica (os das trocas de casais, não os da música) tem um termo delicioso para descrever uma mulher single que se queira envolver com outros casais, chamam-lhe o Unicórnio, porque é tão raro que praticamente pertence ao reino da fantasia. Eu acho que este pessoal da televisão anda a vender-nos Unicórnios... e a este respeito só me ocorre uma ideia, se um dia estiverem na baixa da cidade e ouvirem cascos a soar no asfalto...o mais provável é serem cavalos ou burros, eventualmente zebras, mas dificilmente serão Unicórnios. Não quer dizer que não os haja... Mas quem já viu algum ? Portanto desfaça-se o mito.

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Mulheres pequenas...

Os meus pais têm 10 netos, distribuidos por 4 filhos.
A minha irmã tem 2 raparigas e 1 rapaz, o meu irmão tem 2 rapazes e 1 rapariga, a outra irmã tem 1 casal... tudo muito equilibrado portanto, mas eu tenho 2 raparigas... e pelo que me é dado a observar, esta é uma combinação diferente, muito diferente.

Eu vivo com 3 mulheres. Dito assim, até parece que Deus respondeu ás minhas preces, mas analisando o caso em profundidade, só me ocorre dizer, que se calhar, não me expliquei bem quando exprimi os meus desejos. É verdade que a adolescência passada num colégio interno só de homens, tem um efeito tipo "red bull"... dá-nos asas... mas Deus... não era bem assim que eu tinha imaginado a coisa. PS - Ainda vais a tempo de emendar ;)

Tenho em casa um quarto cor-de-rosa, o quarto das mulheres. Um homem nunca iria tolerar um quarto cor de rosa... mas duas mulheres...enfim. O quarto das mulheres tem armários e gavetas cheios de roupa de mulher pequena e algumas das peças, não me são familiares. Não fui treinado para vestir collants, saias ou vestidos. Homem que é homem, sabe despir... portanto quando me pedem ajuda, faço os possíveis, mas definitivamente não está na minha natureza. Tentem sentar uma mulher ao colo e vestir-lhe uns collants... é um processo contra-natura. Escovar o cabelo, ainda vá que não vá... mas colocar ganchos é ter a certeza que na escola percebem logo quem as vestiu pela manhã. Eu bem as tento enganar, dizendo que o facto de o cabelo ficar em pé ou aparentemente assimétrico é "fashion" uma palavra a que elas habitualmente são sensíveis, mas ultimamente percebi que toleram o meu mau jeito sem grandes argumentações e depois, sozinhas, sem que eu esteja a ver, ajeitam aquilo à sua maneira. Já com a roupa, desisti de argumentar. Levem o que quiserem, porque sinceramente, ás 7h da manhã não há paciência para discutir roupa e tentar demonstrar que sim, que os sapatos têm uma risquinha azul, mas que esta combina com o vestido e com a fita e com as unhas! HELP!

Também já aprendi que as mulheres pequenas, ao contrário do que parecem, não são mulheres grandes em miniatura, são uma espécie à parte, estão em evolução. As mulheres com menos de 10 anos não são mulheres, são princesas, com tudo aquilo a que têm direito, vestidos com rendas, varinhas mágicas para espetar nos olhos, sapatos de salto que fazem barulho e tiaras de plástico para espezinhar e partir em mil pedaços. Uma princesa não pede nada ao pai, ela tenta sim, seduzir o pai, ao ponto de querermos desesperadamente dar-lhe o que quer que ela deseje, como se no fundo a ideia inicial fosse nossa. As princesas marcam o seu território na casa, como se de um reino se tratasse. Não o fazem da forma convencional, mas com bonecas, ganchos, elásticos, fitas para o cabelo, escovas, acessórios de bonecas... e tudo aquilo que nos dê a sensação de que passou um tornado lá em casa. Não será portanto de estranhar, encontrar um mini salão de cabeleireiro no hall de entrada, um dormitório de bonecas no escritório, um supermercado na sala ou a casa de banho transformada numa enorme linha de lavagem e secagem de cabelos de bonecas. Faz tudo parte de um elaborado plano cujo objectivo ultimo é tomar conta da casa, de todas as divisões, sem excepção.

As princesas pintam-se... muito, e perfumam-se ainda mais. Pintam tudo o que esteja ao alcance do braço e como tal não se limitam à cara, ás paredes ou aos sofás. A pintura é uma forma de expressão e elas levam isso muito a sério... ah, e não vale a pena resistir. Se elas quiserem experimentar as várias tonalidades de batom na boca do pai, o melhor é fingir que entramos em coma e esperar que passe, ou que eventualmente o batom se acabe, o que não é raro porque elas tendem a carregar.

As princesas têm uma dificuldade enorme em ver alguém sentado a ver televisão. Há qualquer coisa naquelas cabeças, que entende que um homem sentado, só pode estar à espera de espectáculo, portanto é quase certo que mais cedo ou mais tarde, há passagem de modelos, com as roupas e acessórios da mãe, ao som de uma qualquer musica improvisada e com uma coreografia habitualmente muito desajustada à idade. Se se sentam a vêr televisão, optam tradicionalmente por uma qualquer série juvenil na linha da Hanna Montana, dobrada em Português, ou uma típica novela portuguesa com muito drama, traição e ciúme. Assustam-se com cenas de tiros e pancadaria, mas arregalam os olhos se vêm um homem a beijar uma mulher e em menos de nada já querem saber tudo sobre beijos com lingua e respectivos amassos, incluindo o porquê das cegonhas e dos cegonhos.

Invariavelmente, a hora do banho, é mais complexa do que seria com um rapaz... não que haja mais coisas para lavar, pelo contrário, há é mais coisas para experimentar, e não vale a pena dizer que hoje não é dia de lavar o cabelo... está ali o amaciador, é para ser usado.

Ou seja, eu estou a criar mulheres que um dia vão viver com alguém, que eventualmente as vai amar por aquilo que elas forem, e não por aquilo que elas foram. Por aquilo que elas são, amo-as eu!





sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Fixações :)

Há uma linha que separa a loucura da sanidade, o hábito da obsessão e a dor do prazer. É uma linha muito, muito ténue… e para quem como eu, a roçar os 40, começa a ter dificuldades de visão ao perto, esta linha é praticamente invisível. Correndo o risco de ser mal interpretado devido à inevitável generalização, aquilo que não se vê tem grande probabilidade de não existir, excepção feita a algumas pessoas, que não se vêm, mas sabemos que estão lá, talvez.

Tenho em casa, uma mulher adulta, com 34 anos, aparentemente saudável e em vias de se doutorar. Academicamente brilhante, esta mulher tem uma fraqueza… pelo menos que eu saiba. A fraqueza dela está num pequeno corredor de uma grande superfície comercial, a Staples, essa verdadeira meca do material de escritório, e derivados. Convenhamos que não é um corredor qualquer… não é o corredor dos envelopes, dos dossiers, das impressoras ou dos telemóveis…é o corredor mais maravilhoso de toda a loja, o corredor das canetas e das borrachas, uma verdadeira montra de utensílios que permitem a escrita e a respectiva emenda. Ali, tudo alinhado e pendurado, como que a pedir, toca-me, experimenta-me. Ela chama a esse corredor, o seu lugar de conforto. Ali, o tempo pára, faça chuva ou faça sol, ali é sempre primavera. Há que ver todas as canetas… as grossas e as finas, a cor, o peso, o comprimento, a zona onde os dedos de apoiam, o traço, o mecanismo de abertura, a estética geral…e há as borrachas, as borrachinhas, as borrachonas, brancas, verdes, cor de rosa, macias, duras, com e sem cheiro, redondas, rectangulares, quadradas… uma panóplia de opções com um objectivo único, escrever bem, e apagar, com estilo... ou antes, com prazer.

Há já algum tempo que conhecia esta sua fraqueza, mas agora mais recentemente percebi que não era caso isolado. Peguei no telefone, e fiz um pequeno inquérito junto dos meus amigos e familiares. A amostra é representativa e inclui Continente e Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira. Os resultados, mostram bem que a tal linha… já era.

Há quem se perca na FNAC…na zona dos livros, mas depois uma qualquer força invisível encarrega-se de a desviar para na zona dos bloquinhos, dos caderninhos, lindos, queridos, daqueles que dá vontade de ter para escrever, ou só para olhar. Há os brancos, com linhas, com quadrados, tipo agenda, de capa dura, de capa mole, com argolas, sem argolas, com padrões, com cores, com fita marcadora, sem fita marcadora, com elástico, sem elástico, com molinha, sem molinha, A5, A6, A7… são tão lindos que quem os compra, não precisa deles, não os quer para escrever, simplesmente quer, e é tão bom ter…É um pequeno conforto.

Há quem se perca na Acessorize… correndo o risco de perder uma hora inteira de almoço, a ver tudo, tudo, tudo… e no fim sai de lá com um sorriso nos lábios e sem nada na mão, como se o simples facto de poder admirar os bloquinhos de post-it, com ursinhos, com veadinhos, com folhinhas de Outono, alimentasse o estômago. Ás vezes compram… acessórios, que depois não acessoriam nada, porque não dão com nada, porque não servem para nada, ou porque simplesmente são tão giros que seria uma pena usar, e isso seria deturpar o princípio subjacente a esta pequena loucura.
A minha irmã mais nova, que também se perde na Acessorize, consegue ainda bater o recorde da mais longa permanência voluntária num espaço confinado, com cerca de 2m x 2m… uma muito, muito, pequena loja, cheia de velas e sabonetes feitos à mão... Não há muito por onde circular. Praticamente a pessoa roda sobre o seu eixo como se de um ponteiro de relógio se tratasse… obviamente, para ela, é como se fosse o ponteiro das horas, roda lentamente, e no fim, bem, no fim não precisa de velinhas nem de sabonetes… mas sabe tão bem.

Tenho uma colega que mora num apartamento, não tem quintal, tem uma pequena varanda com alguns vasos. Ela adora um determinado corredor do AKI. Ela não só adora, como efectivamente compra naquele corredor. Compra máquinas de jardinagem, daquelas para podar sebes, para aparar os canteiros… e sei que em tempos esteve mesmo para comprar um daqueles carinhos corta-relva, não que ela tenha relva na varanda… mas são tão giros, e dá mesmo vontade de andar ali de um lado para o outro a cortar a relva…

Hoje estou plenamente convicto que a maioria das pessoas que ler isto, vai tentar identificar o seu lugar de conforto. Aquele lugar onde ficamos literalmente estúpidos, esbabacados, zen. Aquele lugar onde contemplamos os objectos expostos como se realmente precisássemos deles… não para o fim a que se destinam… mas porque queremos, porque desejamos... porque são giros, ou queridos ou fofinhos, ou cheiram bem... enfim, porque sim.

Eu também tenho o meu corredor… e quando penso sobre isso não tenho grandes dúvidas. Não é nada de especial, aliás raramente é. Fica algures no Aki, ou na Leroy Merlin… é um pequeno corredor de ferragens… e nas suas prateleiras, tem os mais variados sistemas… de fixação! Eu sei que são essencialmente buchas e parafusos… mas eu gosto… e ás vezes compro… um dia posso precisar ;)

Quem se atreve a confessar ?!


quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Importado... o &%$$#$ !

É curiosa a forma como determinadas pessoas (des)arrumam as ideias na sua cabeça. Será preconceito ?
Lembro-me de quando era miúdo, no Brasil, importado era sinónimo de luxo. O que quer que fosse. Podiam ser bananas, frigoríficos ou automóveis. Importado era mais caro e geralmente sinónimo de grande qualidade, portanto quando um vendedor dizia, tenho nacional e importado... a escolha era uma função matemática complexa que entre vários factores, em última análise, estava na dependência directa da conta bancária.

Aqui entre nós, as coisas não eram muito diferentes. O mármore Italiano, o cristal de Murano, o perfume Francês, os relógios Suiços, o chocolate Belga... enfim, um sem número de coisas que até se podiam fazer parecidas por cá... poder podiam... mas não eram a mesma coisa.

Hoje em dia, com a globalização, comemos bananas do Panamá, uvas do Chile, carne Argentina, papaia do Brasil, café da Colômbia e mais não digo porque acabei de perceber nitidamente que o Mercosul está a papar a União Europeia, em grande. A verdade é que sempre fomos um país de importadores, e uma das coisas que sempre importámos foram automóveis. Baratos ou caros, durante bastante tempo eram 100% importados, até que nos últimos anos algumas fábricas por cá se instalaram. Ou seja, podíamos estar parados na fila da auto-estrada e ter a certeza de que a imensidão de carros à nossa frente e atrás, eram todos, mas mesmo todos, todos, todos, sem excepção, importados!

Bem, isto tudo a propósito de uma cena que me tira do sério... e faz-me lembrar o já famoso episódio da "caixa do iphone" ! Desde que tive de comprar carros com o meu dinheiro, decidi que mais valia um usado gama alta do que um novo gama baixa. É uma opção pessoal, muito discutível, como todas as minhas opções pessoais. Assim pensei, e assim realizei. Cedo comecei a comprar carros directamente na Alemanha, trazer para Portugal, pagar o que era devido, matricular, e circular com um sorriso nos lábios.

Aparentemente a minha ideia não era muito original, e o Estado, o tal com o qual mantemos esta relação pecaminosa, achou por bem que os prevaricadores do sistema (por sinal legal) fossem de alguma forma marcados a ferro, por forma a que o tal sorriso ganhasse um tom mais amarelado. Durante alguns anos, os que como eu foram modernizando o parque automóvel nacional, tinham que ostentar na sua matrícula, nada mais, nada menos que um "K" ! Não era um "W" ou um "Y", era um "K" ! que em Português clássico pronuncia-se como a terceira pessoa do singular do presente do verbo "Capar"... e capar, não é bom ! Mais valia dizer "capei-te"! Que é como quem diz, espetei-te um "K" nesse lindo carro! Tirei-te o tesão de ter um carro bom ! Ter um "K" na matrícula, era o mesmo que ostentar um enorme letreiro no vidro de trás a dizer: "o gajo que está a conduzir este carro, julgou-se mais esperto que os outros, foi buscar este carro lá fora e não quis pagar cumulativamente os lucros do fabricante, do importador, do distribuidor e do estado, portanto capei-o ! Assinado, O Estado."

Por muito bom que fosse o carro, e habitualmente era, o "K" arruinava qualquer possibilidade de transacção futura com um mínimo de dignidade. Qualquer potencial comprador ao vislumbrar o "K" torcia imediatamente o nariz, como se o carro fosse de produção duvidosa, montado numa qualquer fábrica clandestina, onde se exploram criancinhas, no Bangladesh! Qualquer Porshe, Mercedes, Audi ou BMW, ganhava estatuto de cópia rafeira, e se o tentasse vender num stand, diziam logo com desdém, ah... mas é importado... Ao que imediatamente poderíamos retorquir, é importado sim senhor e os Mercedes que o senhor tem aqui para venda , são feitos onde ??? em Carnaxide ??? em Matosinhos ??? que &%#$#%...

Os "K" assassinaram as matrículas dos automóveis, e nós até temos matrículas fantásticas, como a do telefonista "AL.OO.OO", a do adepto de futebol "MA.OO.OO", a egocêntrica "EU.19.71", a do revoltado "NA.OO.OO" e a minha preferida de todas, talvez pelo seu cariz porno-erótico intenso e apaixonado "OO.OO.OH"...

Felizmente, durante o período em que durou essa virtuosa lei, não troquei de carro e escapei-me aos Kapas. Mas pouco depois achei que era altura de trocar e dessa vez, poupei o trabalho de ir à Alemanha. Remediei-me por cá, junto de um vendedor meu conhecido, o qual, ia ele próprio buscar as viaturas lá fora. Namorei o veículo, negociámos o preço e sai do stand com um carro alemão XPTO com uma matrícula politicamente correcta e certo de que tinha feito um bom negócio.

Cerca de 4 anos depois, quando, por razões familiares, um carro de 2 lugares já não fazia muito sentido,  resolvi voltar ao mesmo stand para tentar uma troca. Já levava obviamente a matéria estudada e sabia mais ou menos o valor pretendido. Cheguei, expliquei ao que ia e sentei-me junto do vendedor / comprador enquanto ele consultava as tabelas, o computador, mais tabelas, um telefonema para este, um telefonema para aquele, e no fim, com um ar compenetrado atira-me à cara um valor x ! x ?! disse eu! Ouça lá este carro vale praticamente o dobro daquilo que você está a oferecer ! E ainda por cima comprei-o aqui ! Então mas você agora deu em gozar comigo ? O homem permanecia em silêncio com um olhar cabisbaixo... A certa altura, levantou-se, caminhou lentamente para a porta,  virou-se para mim, e encolhendo os ombros sai-se com esta... Sabe o que é doutor... o carro é importado !


terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Eu me confesso

Vamos por as coisas nos seguintes termos, não sou escritor e acredito que a maior parte dos bloguers (?!) também não o sejam, pelo menos de forma profissional.
Tenho no meu círculo de amizades, pessoas que escrevem bem, profissionalmente, ou de forma quase profissional, e confesso que não sei como o fazem... ou melhor, não sei como conseguem.
Quero com isto dizer que o ímpeto criativo não mora em mim. Já procurei, e não encontrei. Não sei, e na verdade também nunca tentei, escrever por obrigação, portanto tudo isto é muito novo...e estranho.

Pela primeira vez publiquei fora do espaço semi-restrito do Facebook, e o feed-back tem sido para lá das minhas melhores expectativas, o que não é dificil, uma vez que não havia expectativas à partida, mas 500 visualizações depois, senti-me como que obrigado a dizer qualquer coisa sobre o tema.

Como será fácil de verificar, não faço ideia o que seja o acordo ortográfico. O meu português tradicional já leva cada pontapé nos ss nos ç nos ões nos ôem e nos êem, que a aventura pelo acordo seria com certeza um atentado sobre outro atentado, ao que o blogue correria o risco de ser mais conhecido pelas suas calinadas, vulgo desacordo, do que propriamente pelo seu eventual conteúdo.

O mesmo se passa com as pontuações. Talvez porque admirei tanto o Saramago que tantos odeiam, assumi que esta coisa da pontuação era um pouco arbitrária... digamos, criativa. Vai daí, e como provavelmente o Professor Carmo, que tantos ex-alunos do CM e do Manuel Bernardes conhecem, não é um dos meus leitores, tomei a liberdade de me ir esticando... e sim, ocasionalmente uso os gerundios como rindo, lendo, brincando... influencia da minha infância de emigrante passada em São Paulo, Brasil. Não tem nada a haver com Gabriela, e córóneis e quengas ou invertidos... é mesmo uma memória implantada.

Regresso aos parágrafos de abertura.
Não sei de onde vem a inspiração, acho que é um ligar de pontas soltas que um dia parece uma história e, toca a escrever. No entanto tenho por minha a ideia de que só vale a pena escrever se valer a pena ler e nesse aspecto sou muito crítico comigo mesmo. Ao contrário da minha amiga Bárbara que escreve melhor quando está irritada e tem pela frente um bom copo de vinho, eu não escrevo se estou irritado e se for tinto o mais provável é ir dormir a seguir. Por outras palavras, é possível, é provável, é quase certo, que este blogue tenha alguns, mais ou menos longos, períodos de bradicárdia, já para não dizer completa assistolia. Não levem a mal, não é falta de respeito por quem perde o seu tempo a ler isto, é mesmo falta de tema interessante que valha a pena.

Dito isto...
Obrigado a todos os que me têm empurrado para este precipício e  deixo aqui um verdadeiro aviso à navegação: "Keep your expectations, low..."







segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

A tribo do surf


Há vários anos que penso nisto, mas agora, nem sei bem porquê, achei por bem partilhar estes meus pensamentos…

Acho que desde sempre estive ligado ao mar. Sou filho, neto, bisneto e trisneto de ilhéus. Nunca tive uma casa que não tivesse vista para o mar, já mergulhei até aos 40 metros de profundidade, e agora recentemente, bateu-me forte esta coisa da vela de cruzeiro…no entanto, nunca fiz surf.

Nem percebo bem porque é que nunca fiz surf… tenho familiares surfistas, amigos e conhecidos surfistas, mas sabe lá Deus porquê, nunca tentei. Se calhar porque também nunca andei de skate, e no meu tempo (va lá… anos 80) o surf era uma evolução natural do skate, mas em versão molhada. Ainda assim, o seu vocabulário não me é estranho… mar flat, offshore, inshore, mar picado, finos, tubos (que eu chamava túneis até ser veementemente repreendido)…enfim…Agora que deu-me para correr junto ao mar, cruzo-me quase todos os dias com eles e com os seus rituais.

Se eu fosse um extra-terrestre de visita à terra… ia ficar cheio de dúvidas. Eles chegam à praia de carro. Estacionam e ficam a contemplar o mar…mais tarde começam a despir-se… fazem um strip quase total, e a certa altura, enrolam uma toalha à volta da cintura. Ali estão eles, praticamente nus, junto à estrada, com uma toalha enrolada à cintura ! Começam então a deslizar para dentro do fato de neoprene. Vestem-no habitualmente até à cintura e param. Deixam cair a toalha e agora viram-se para a sua prancha. Retiram-na delicadamente de dentro do seu saco (?) e começam a esfregá-la com cera (wax em linguagem surf)… a prancha que era toda gira, fica agora amarela e rugosa. Ato completo, vestem o resto do fato, e prancha debaixo do braço avançam para o areal. Caminham descalços pelo alcatrão como se estivessem a pisar ovos…pés apenas parcialmente apoiados…Chegados à areia, nova fase de contemplação, mais ao menos longa consoante a atmosfera. Alguns alongamentos, e lá vão eles mar a dentro na sua prancha.

Quem, como eu, mora ali para os lados de Carcavelos, já percebeu que havendo ou não havendo ondas… eles entram mar a dentro. Aliás, começo a achar que as ondas nem sequer são um requisito para a pratica da modalidade. Parecem náufragos a tentar abandonar a ilha nas suas pequenas jangadas, mas inevitavelmente o mar lá os traz de volta. Nunca vi nenhum que tenha de facto conseguido escapar… mas todos os dias eles tentam, sem sucesso.

A tribo do surf, alterou-se do ponto de vista demográfico. Hoje há muitas mulheres… aliás muitas mesmo. Confesso que vê-las num fato de neoprene colado ao corpo é muito mais interessante do que ver os tipos grisalhos da minha geração. Elas trouxeram um novo estilo… os mesmos rituais…mas muito mais estilo. Quando param para se despir… ou quando saem do mar, e param junto ao duche para tirar a areia dos pés, o pessoal pára mesmo para ver. Quem como eu corre, e não pode parar, vai virando o pescoço, até que já não é possível continuar a rodar devido à excessiva angulação e ao perigo de me espalhar ao comprido.

Facto é que, aos elementos desta tribo, vejo-os quase sempre a meio da manhã, aos dias de semana… e não percebo. Esta malta não trabalha ? tem horários porreiros ? estão desempregados ? são meus colegas ? Hoje estive quase para parar e perguntar… desculpem lá… vocês o que é que fazem na vida? Mas infelizmente não posso parar… A tribo do surf está mais interessante, mas deixa-me muitas dúvidas, ainda.

A espera...


Esperar é uma constante da vida.
Esperamos para nascer… e daí para a frente, esperamos por tudo, ou por quase tudo.
Saber esperar é uma arte, eventualmente uma virtude.
Como cirurgião, tenho muita dificuldade em esperar… deve ser deformação profissional. Já os Anestesistas por seu lado estão habituados a esperar… portanto cada um é como é.
Esperar por alguém, por um telefonema ou por um determinado momento pode ser um processo verdadeiramente angustiante.

Um filme do qual gosto particularmente (ver aqui o trailer) descreve a sala de espera das chegadas de um aeroporto como sendo um dos lugares mais felizes do mundo… e é verdade. A espera pelo reencontro é uma espera feliz, e é provavelmente uma das raras excepções ao verbo, mas a forma como esperamos por algo, diz muito sobre nós próprios… e a psicologia humana tem zonas pantanosas onde facilmente nos deixamos enganar.

Aqui há dias, o meu pai relatava-me um artigo que lera recentemente sobre a espera das bagagens num determinado aeroporto made in USA.
O aeroporto era bastante moderno, e todo o processo de desembarque dos passageiros tinha sido optimizado, no sentido dos mesmos chegarem rapidamente à zona de recolha da bagagem. Independentemente do local de desembarque, em menos de 1 minuto chegavam aos tapetes.
Apesar deste esforço de planeamento, os responsáveis do aeroporto continuavam a receber inúmeras reclamações dos passageiros, que em média, uma vez junto aos tapetes, aguardavam cerca de 7 minutos pela sua, não extraviada, bagagem.
O processo de resolução do problema parecia demasiado complexo… até que alguém teve uma ideia brilhante, deslocalizar os tapetes em relação ás mangas de desembarque. Agora, um passageiro que desembarca neste aeroporto, percorre cerca de 8 minutos de intermináveis corredores… e quando chega aos tapetes, a bagagem está à sua espera. Não houve mais reclamações.

Este episódio, fez-me reflectir sobre as salas de espera dos hospitais onde trabalho.
Numa sala de espera hospitalar cruzam-se várias tribos e poucos locais têm esta particularidade.
Alguns anos de prática permitiram-me fazer uma classificação das várias sub-espécies de esperadores.

Os Impacientes
O paciente impaciente, raramente se senta. Deambula pela sala de espera. Quando se senta, troca frequentemente de lugar, como que à procura do assento perfeito.
Estes são aqueles que falam alto e falam sozinhos, refilam, queixam-se de que os nossos ordenados são pagos com os seus impostos e olham em redor à espera de aprovação. Chegam logo pela manhã cedo, à hora do almoço ou à hora do jantar. Raramente são vistos se houver jogo da selecção ou se o dia estiver de praia. Sempre que ouvem um nome ou um número no altifalante, vêem bater à porta e perguntam se já chamamos por eles. Raramente estão doentes mas conseguem enlouquecer os que estão à sua volta. Aliás, para ser mais correcto, a maioria dos impacientes são de facto, acompanhantes.

Os Resignados
O resignado é uma espécie cada vez mais rara. Vejo-os já muito de vez em quando e a maioria, não está verdadeiramente resignada, mas sim alcoolizada, motivo pelo qual, adormecem frequentemente na sala de espera, não respondem ás múltiplas chamadas e nem percebem que passaram a noite a curar a ressaca no hospital. Apresentam múltiplas escoriações na face e nos membros em diferentes fases de evolução, sendo difícil de caracterizar as que são de agora e as que são da semana passada.
O resignado, não refila, tem um bafo intenso capaz de anestesiar uma sala, ri-se dos que estão sóbrios e deseja-nos as melhoras quando tem alta.

Os Profissionais
Apesar do aumento das taxas moderadoras, ainda existem muitos profissionais. Os profissionais, conhecem o sistema. Sabem que não vale a pena vir ao hospital ás horas de mudança de turno nem à hora das refeições. Conhecem a escala de serviço e já conhecem muitos dos seguranças, enfermeiros e médicos. Escolhem as melhores horas, e já sabem como fintar a triagem de Manchester para obter uma prioridade mais elevada. É hábito fazerem-se acompanhar por um saco de plástico de cor branca, azul ou rosa com dezenas de caixas de medicamentos no seu interior, que prontamente despejam sobre a secretária do primeiro coitado que os atender. Têm um rol interminável de doenças e maleitas e independentemente das atitudes terapêuticas nunca ficam permanentemente bem. Prometem voltar, porque invariavelmente não têm médico de família, ou este está de férias.

Os Ciganos
Os ciganos são a verdadeira tribo. Vêm em bando e acampam. Habitualmente não ficam na sala de espera, não cabem, ao invés procuram um qualquer relvado perto e deitam-se, espreguiçam-se e passam pelas brasas. Os homens ficam num grupo e as mulheres num grupo à parte. Os miúdos sem penugem, ficam com as senhoras. Passam o dia inteiro na urgência, porque já que vieram em grupo, inscrevem-se em grupo e só vão embora quando o último elemento for observado. Se por acaso algum deles ficar internado, então o acampamento começa a tomar outras proporções, organizam turnos, criam casas de banho improvisadas e tomam posse do local.

Os Pijaminhas
Este grupo é o mais estranho. Independentemente da hora do dia, vêm de pijama para a urgência, habitualmente por meios próprios e com acompanhante. Existem duas sub-espécies principais, com e sem robe, mas partilham os mesmos aspectos básicos, a saber, pijama de flanela com padrões de Kittys, Garfield ou Homem Aranha, e pantufas. As pantufas podem ser mais ou menos exuberantes, com cabeças de coelhinhos, esquilinhos, ou qualquer coisa terminada em inho. O pijama em si, é suposto ser um indicador de gravidade da doença, enquanto o robe distingue os que também têm calafrios. Quando em presença de um médico, este grupo habitualmente está ás portas da morte. Apenas recuperam quando voltam para a sala de espera a aguardar as análises. Os pijaminhas não se deixam intimidar pelas batas brancas e juram a pés juntos que aquela dor que dura há 2 meses hoje está diferente e é verdadeiramente insuportável. Enfim, os pijaminhas fazem-me sorrir.

Os Doentes
Os doentes raramente ficam na sala de espera…

sábado, 5 de janeiro de 2013

O Bonito... ou "As aventuras de um pai, por alturas do Natal"

Assim aconteceu! De repente, "home alone" com um naco de gente... quatro anos mal amanhados, sorriso maroto, um metro de altura e uma personalidade em pleno Big Bang... pelo menos se não é o Big Bang, é uma super nova...


Entre cozinhar para dois, ou um "jantar romântico", por sugestão da própria optei pelo "jantar romântico" num centro comercial perto de casa.


Pelo caminho fui engendrando um plano para, de alguma forma, escapar ao fatídico Happy Meal do McDonalds... não foi difícil. Isto das crianças tem muito a haver com aquilo que lhes pomos à frente dos olhos, vai daí, mal chegados ao Food Court, lanço um entusiástico "Quem quer Pizza ???" e a resposta imediata não se fez esperar "Eeeeuuuu !!!". Primeira batalha ganha. Imediatamente e antes que a pequena percebesse a jogada, rumei a uma Pizzaria que faz umas deliciosas pizzas super saudáveis à base de massa integral, rúcula e mozarella.

Já sabia ao que ia, e encomendei uma pizza para dois. Trinta segundos depois, uma mini mão dáva-me sacudidelas no braço..."já comemos ? já comemos ? já comemos ?"... Oh Leonor que história é essa do "já comemos ?" então não vez que ainda não comemos ? "então és tótó ! já pagaste e nós nem comemos...". Toca a explicar que em alguns lugares pagamos antes, e noutros pagamos depois... e essa história do tótó é lá na escola ok !?

Pizza no tabuleiro, arranjamos um lugar para sentar... fiz as respectivas divisões e à primeira garfada, sai-se com esta "Estou aflitinha!".Oh Leonor, agora aguentas um bocadinho OK ? Acenou que sim com a cabeça e eu comecei a devorar a pizza antecipando um final conturbado... Um ou dois minutos depois... "Agora estou mesmo aflitinha... acho que não aguento!"...

Só os pais, pais macho, de miúdas, é que percebem isto que eu agora vou contar...
Despachei alarvemente a pizza, dei a mão à rapariga e encaminho-me rapidamente para a casa de banho mais próxima, que num centro comercial, nunca fica perto do local onde estamos. Chegádos à porta, assaltou-me uma questão... WC Homens ? ou WC Mulheres ? Percebem o dilema ? Entrar por um WC de homens a dentro, e vê-los virados para a parede a sacudir a coisa, não me parece que seja apropriado para uma miuda de quatro anos... Fiz um raciocínio rápido, e pensei, os WC das senhoras são compartimentados, não há risco de andarem por ali a secar a coisa no secador... Vou a meter a mão na porta das senhoras, quando uma dona grande com ar de varina (pelo menos cheirava) antecipa-se, atira a mão ao puxador e lança-me um olhar de desagrado que me trespassou mortalmente. Engoli em seco. Fiz um ar de quem estava algo baralhado, e nisto vejo a minha salvação, WC deficientes !!! Porque deficiente mesmo é a figura que um gajo faz !!!

Nem vale a pena relatar a parte do "Pai... estás a ouvir ?" Ouvir o quê Leonor ? "o xixi ?" Não Leonor não estou a ouvir..." E agora ? Agora estás ?"... é demasiado triste !

Uma vez que a pizza estava perdida, entendi que não tínhamos reposto convenientemente as calorias devidas ao jantar... e sugeri um gelado para por fim ás hostilidades. O Haagen-Dazs não é difícil... são todos bons... para um adulto.
A Leonor fez questão de testar a paciência do senhor dos gelados, e foi provando quase todos os que por lá havia, exibindo uma careta, por cada colher que metia na boca, incluindo Strawberry Cheesecake, Banoffee, Cookies and Cream, Chocolate Chips... e quando achei que já nem eu ia levar gelado à conta da Leonor, esta aponta para um recipiente e diz, quero este, Limão ! O homem ainda perguntou, "queres provar este ?" ao que ela respondeu muito séria. "Não! quero levar este... tótó". Sem comentários.

Dadas as voltas necessárias, regressamos ao parque de estacionamento e sento a Leonor no banco de trás. Mal se ajeitou na cadeira..."Podias ajudar óh Tótó ?!" o quê Leonor ? que conversa é essa do tótó e do podias ajudar ? "Podias ajudar a por o cinto que eu não consigo..." Respirei fundo... isto deve ser da hora...

Circulávamos já dentro do parque em direção à saída e a moça pequena remata com esta "óh tótó, vê lá se vais com cuidado para não bater!". Fervi. Virei-me para trás e com ar de mau disse, olha, acabou-se essa história do tótó ! não quero ouvir mais essa palavra ! Estás a ouvir ? Mais uma dessas e acabaram-se os gelados !

Fez-se um silencio sepulcral... e arranquei. Cá para os meus botões, ia pensando, fizeste bem, tinhas que marcar uma posição, tens que educar, elas têm que aprender... nisto... sai uma voz lá de trás... "óh Bonito !..."

Serei Gay ?

Um homem acorda de manhã, e percebe que a cama e os lençóis onde dormiu já renderam receita ao estado a quando da sua compra.

Levanta-se, acende a luz, e contribui para o estado através da sua conta de electricidade. Põem a água do duche a correr, e o estado já está a facturar nas contas da água e do gás.


Rapidamente percebe que o shampoo, sabonetes, pasta de dentes, desodorizante e perfume também já deram a sua contribuição para o estado no momento da compra…

Obviamente, assim que se começa a vestir, é atacado pela imagem da compra do vestuário, e,por estranho que pareça, o estado também arrecadou uns cobres…

Abre o frigorifico… mais uns trocos para o estado na electricidade… retira qualquer coisa para comer… qualquer coisa que já deu dinheiro ao estado…

A ideia persegue-o… fecha a porta de casa… ai a casa, a casa que rendeu ao estado quando a comprou e que anualmente leva mais um tanto em imposto sobre imóveis…

Entra no carro… oh meu deus, o carro já rendeu ao estado no imposto automóvel e rende anualmente em imposto de circulação… O carro está sem gasolina. Pára na primeira bomba, e vê os euros a passar na máquina… uns para a gasolineira, outros para o estado… o que vale é que neste momento basta gasolina… se precisasse de pneus, ou escovas, ou o que quer que seja, o estado levava mais um pouco…

Chega ao trabalho… é dia de receber, mas o estado já levou uma boa fatia do ordenado. Pausa para almoço. Avança na fila do refeitório e quando chega à hora de pagar… eis que o estado pede mais uma pequena contribuição…

A situação é deseperante… acaba o dia de trabalho e corre para casa, a dor de cabeça não o larga, passa por uma farmácia, compra uma aspirina e dá uns quantos miligramas ao estado, não vá o estado precisar…

Entra em casa angustiado, despe-se, corre para a cama e enfia-se sozinho debaixo dos lençóis… é assolado por um pensamento… o estado anda a comer-me… serei gay ?

A Caixa...

Os meus amigos com certeza não sabem, mas aqui há uns meses atrás o meu iPhone teve aquilo que na gíria médica se poderia denominar uma morte dolorosa. O episódio é por si só demasiado triste para sequer relembrar.


A questão é que morto o iPhone, necessitava de algo que o substituísse, e um pouco na onda dos meus amigos "open source" lá decidi embarcar na aventura Android. Fiz alguma pesquisa, e pelos valores que estava disposto a pagar (pouco), não havia nada de muito interessante. Vai daí, decidi fazer para uma pesquisa mais alargada e encontrei um telemóvel que aparentemente me enchia as medidas, camera de 8 Megapixeis, Sistema Operativo Android 4.1 Ice Cream Sandwich (o nome do sistema operativo é delicioso), dual sim, enfim, um sem número de predicados que convenceram aqui o "je" a mandar vir directamente da China, a preço de saldo um fantástico e conhecidíssimo W1 da não menos famosa marca THL.

Ora adivinhem lá o que quer dizer THL ? Technology Happy Life ! Nem mais ! Só pelo nome já valia a pena comprar.
O W1-THL, viajou meio mundo e veio parar ás minhas mãos. Uso-o desde então no meu dia-a-dia, já lá vão alguns meses.

Acontece, que não é a mesma coisa... começo a achar que um iPhone é como aquela mulher que amamos perdidamente e depois resolve seguir a sua vida sem nós... para a esquecer, bem que podemos tentar A, B e C e todas as letras do alfabeto, não é a mesma coisa... o sabor não é o mesmo, o toque não é o mesmo, até o cheiro não é o mesmo.

Eu juro que tentei adaptar-me ao meu Ice Cream Sandwich, mas há ali qualquer coisa, que não é um iPhone.
Esta sensação de desajuste foi germinando, até ao dia em que decidi, que se lixe o Android, eu quero mesmo é um iPhone! Mas os tempos, como os meus amigos sabem, não estão para grandes aventuras financeiras, e apesar daquele ser a "mulher da minha vida", tudo tem um preço, e mais uma vez decidi que haveria outras formas de comprar o dito cujo, sem que para isso tenha que trabalhar ainda mais.

Como hoje em dia há fóruns na internet para tudo, ou quase tudo, encontrei pelo menos meia dúzia onde praticamente só se discute iPhone! Toca de me inscrever no forum (para poder escrever) e procurar o pessoal que estava a trocar os seus iPhones pelo modelo mais recente, deixando assim para trás o meu saudoso Iphone 4, a menina dos meus olhos.

Ora então a certa altura, num destes fóruns, há um individuo que coloca o seguinte anuncio "Vendo iPhone 4, sem phones, carregador não original, bloqueado à Vodafone, 200 euros" ! Eh lá ! 200 euros já é um valor simpático, toca de abrir o post. Havia cerca de 2 páginas de troca de mensagens entre o vendedor e os potenciais compradores, comecei a ler... Queriam saber se estava desbloqueado, se tinha factura, qual era a cor, se tinha acessórios, que memória tinha, qual era o sistema operativo, a versão do modem, enfim um sem número de questões, que lá iam sendo respondidas pelo vendedor da melhor forma possível. Lá para o fim das mensagens, o diálogo era já apenas com um potencial comprador que perguntava qual o valor mínimo, ao que o vendedor dizia que eram 200 euros, porque apesar de usado, era um iPhone e há sempre um valor mínimo...

Eis que o potencial comprador decide avançar com os argumentos finais: Se não tem phones, se carregador não é original, e se não tem caixa, então não vale 200 euros !

Bem, aquele post irritou-me... decidi intervir e saí em defesa do vendedor. Escrevi assim, caro senhor, quanto mais não seja, por uma questão de higiene, não me parece bem utilizar os phones já usados com cera de outrem. Quanto ao carregador, creio que faz aquilo que original também faz, ou seja, carrega. Já em relação à caixa, caro senhor, será que a caixa tem alguma função especial que desconheço ?

Não cheguei a ver a resposta, porque fui expulso do fórum.
Entretanto comprei o iPhone a uma colega, pelo que, muito em breve, teremos o nosso reencontro.